quinta-feira, 30 de outubro de 2008

feneço...


Todos os dias eu agradeço a Deus
por ter você ao meu lado
Por ter (de qualquer maneira) o seu amor
Por ter me mostrado o que é amar e ser amado
Deus me deu um Anjo
E após todo este tempo voce ainda me surpreende
com seu carinho, sua sinceridade
e acima de tudo com seu conhecimento
Eu posso não saber muito
Mas tudo que sei são verdades
que você me mostrou ou me ensinou a ver
Sou tudo que sou porque voce me amou
Voce me mostrou tudo o que eu tenho de bom
Eu não tenho como agradecer tudo o que
Você fez por mim
Pois hoje, meu Mundo é um lugar melhor por sua causa
Todo o Amor e toda a felicidade do Mundo
É o que eu desejo a você
Sou tudo que sou porque voce me amou.
Quando você sentir vontade de chorar, não chore
Pode me chamar que eu choro por você.
Quando você sentir vontade de sorrir, me avise
Que venho para nós dois sorrirmos juntos.
Quando você sentir vontade de amar, me chame,
Que eu venho amar você.
Quando você sentir que tudo está acabado, me chame,
Que eu venho lhe ajudar a reconstruir.
Quando você achar que o mundo é pequeno demais para suas tristezas,
Me chame, que eu faço ele pequeno para sua felicidade.
Quando você precisar de uma mão, me chame,
Que a minha é SEMPRE sua.
Quando você precisar de companhia, naqueles dias nublados e tristes,
Ou nos dias ensolarados, eu venho, venho sim.
Quando você estiver precisando ouvir alguém dizer: EU TE AMO!
Me CHAME que eu digo a você a toda hora.
Pois o meu amor é imenso.
E quando você não precisar mais de mim, me avise,
Que simplesmente irei embora, pensando em você.
Mas não me mande...pois feneço longe de você.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Poemas do Irremediavel (IV)



Fora de mim

estes outros limites:

Os outros e o mundo.

Talvez isso justifique

essa evasão:

a existência de uma força

que seja começo e fim,

fundamental monossílabo.

Talvez isso justifique,

essa essência ilimitada

só aceita pelo mundo

com minha forma e a dos outros.

terça-feira, 28 de outubro de 2008


Sossega, coração! Não desesperes!
Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.
Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo!
Pobre esperença a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!


Sossega, coração, contudo! Dorme!
O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme,
A grande, universal, solente pausa
Antes que tudo em tudo se transforme.

sábado, 25 de outubro de 2008

Eu falo difícil!




Em 1949, Millôr Fernandes lançou o livro “Tempo e contratempo”, sob pseudônimo de Emannuel Vão Gôgo. Numa das crônicas deste livro, chamada “Provérbios prolixizados”, Millôr reescreveu de forma erudita dez ditados populares.
Achei muito legal a idéia de Millôr.
De unidade de cereal em unidade de cereal, a ave de crista carnuda e asas curtas e largas da família das galináceas abarrota a bolsa que existe nessa espécie por uma dilatação do esôfago e na qual os alimentos permanecem algum tempo antes de passarem à moela
De grão em grão, a galinha enche o papo.
A substância insípida, inodora e incolor que já se foi não é mais capaz de comunicar movimento ao engenho de triturar cereais
Águas passadas não movem moinhos
Gostei tanto disso que resolvi pesquisar no Google para ver se outros provérbios já tinham sido prolixizados. Encontrei apenas um:
Orifício circular corrugado, localizado na região inferior lombar de um cidadão em alto estado etílico, deixa de estar em consonância conforme os ditames vigentes na sociedade e conforme as leis de propriedade vigente.
Cu de bêbado não tem dono
Fiquei viciado em prolixização e resolvi pesquisar mais sobre o assunto, e encontrei, além de provérbios, algumas expressões prolixizadas.
Sequer considerar a possibilidade da fêmea bovina expirar fortes contrações laringo-bucais.
Nem que a vaca tussa.
Retirar o filhote de eqüino da perturbação pluviométrica
Tirar o cavalinho da chuva
Me empolguei e resolvi ensaiar algumas prolixizações
A parte do corpo humano onde se aloja grande quantidade dos órgãos dos sentidos, além do cérebro e da boca, quando encontra-se em duas unidades, consegue raciocinar e elocubrar de forma superior do que quando encontra-se de forma unitária.
Duas cabeças pensam melhor do que uma
Quando um indivíduo não se manifesta a respeito de um determinado assunto, pressupõe-se que este indivíduo está de acordo com o referido assunto
Quem cala consente

Murilo Gun

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Poemas do Irremediavel (XXVI)



Vieste com a noite, e a mesma manhã te levou.

Tinha pés de sombra quando chegaste:

só um pássaro violou o ar de que partiste.



Entre a chegada e o adeus havia luz:

a cintilação fria das estrelas,

o quase fulgor do nascer do dia.



Vieste com a noite e a manhã te levou,

criamos um mundo como deuses:

mas o real que foi assim construído,

tomou diante dos olhos surpresos,

novas formas, tentou pela desordem

da emoção, a inconsciência do perfeito.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Orgasmo em várias línguas ...


Um amigo meu carioca, de passagem por Lisboa - vamos chamá-lo Guilherme, embora este seja o seu nome verdadeiro - arranjou uma namorada portuguesa. Depois de um revigorante bacalhau com grelos numa tasca sobre o Tejo foi para o berço com a cachopa. No melhor da festa, quando as apaixonadas piruetas encaminharam para o inexorável e delirante clímax, a garota começou a exclamar: "Ai, que me vem! Ai, que me vem!" O Guilherme apanhou um susto. Achou que a moça estava a ter um troço. Na verdade, estava. Estava tendo um lindo orgasmo à melhor maneira alfacinha.

Quando Guilherme voltou ao Rio e me contou a história fiquei pensando sobre como, mesmo quando se trata de sexo, que é uma das poucas actividades humanas em que todos falam mais ou menos a mesma língua, por vezes é necessário um intérprete. "Ai, que me vem! Ai, que me vem!", com seu sabor tão 1890, à Eça ou Camilo, significa o nosso "Estou Gozando! Estou Gozando!", só que muito mais delicado e poético. As brasileiras bem que podiam adoptá-lo.

Outro conhecido meu, que andou pela Indonésia em negócios certamente escusos, foi surpreendido quando, numa situação idêntica, a moça se pôs a gritar "Aku Keluar! Aku keluar!". O fulano quase caiu da cama, temendo estar infringindo algum tabu local. Mas não, a moça estava apenas verbalizando o prazer daquele honesto papai-mamãe lhe provocava.

Bem, para me precaver de possíveis mal-entendidos se e quando a situação se apresentar, procurei saber como as mulheres de diferentes culturas dizem "Estou Gozando! Estou Gozando!" - não ao pé da letra, claro, mas seu equivalente, ou seja, as palavras incontroláveis que vêm do âmago do prazer no momento do orgasmo. Para isso, consultei minhas amigas brasileiras e estrangeiras versadas em línguas, a própria e a dos outros. Limitei a pesquisa às mulheres porque não confio nos homens e também porque me parece que elas prestam mais atenção nessas coisas. Uivos, bufados e ruídos imorais, tipo "Uuuuuuu!", "Grmmmmmmphkkkk!" ou "Brjjjwwkkk!", comuns a todas as culturas, foram descartados assim como as interjeições medíocres como "Yeah! Yeah!", "Oui! Oui!" e "Ja wohl! Ja wohl!" que americanas, francesas e alemãs sem imaginação disparam repetitivamente quando estão gozando. Concentrei-me nas declarações mais articuladas de mulheres que levam o seu orgasmo a sério e descobri que, em alguns casos, a maneira pela qual este ou aquele povo declara "Estou Gozando! Estou Gozando!" ajusta a entender o respectivo temperamento nacional.

Evidentemente que para as línguas mais manjadas não precisei consultar ninguém. A americana diz "I'm coming! I'm coming!". A Francesa "Je viens! Je viens!". A alemã "Ich kamme! Ich kamme!". Tudo isso significa, literalmente, "Estou vindo! Estou vindo!" ou "Estou chegando! Estou chegando!". A sueca emite uma ligeira variante: "Det gar! Det gar!" - algo assim como "Está vindo! Está vindo!" ou "Está chegando! Está chegando!". Como se vê a ideia de que um orgasmo é um fluido em movimento que está a caminho e não demora é universal. Mas há povos que conseguem exprimi-lo de maneira mais enfática. A espanhola, por exemplo, grita "Estoy corriendo! Estoy corriendo!" - o que pode levar um brasileiro incauto a pensar que a moça vai empurrá-lo para fora de cama e sair como uma bala em direcção à porta e justamente quando ele achava que estava abafando.

Já a Japonesa é tão reservada que só deixa para falar depois. Quando você pensa que ela vai chegar ou está vindo uma voz suspira no seu ouvido: "Itchatta yo", que significa um singelo "Acabei de ir". E só diz isso uma vez sem ponto de exclamação. Pode ser meio frustrante para o parceiro mas, se ela declara que já foi é porque está tudo bem - e você que trate de ir também antes que ela resolva voltar.
Em Hebraico é a mesma coisa com a diferença de que a mulher diz "Ani gomeret" - significando um simples e declarativo "Terminei" só faltando assinar e reconhecer a assinatura. Compare isso com o carnaval feito por uma italiana que, ao sentir que vai gozar, proclama triunfante "Arriva!!! Arriva!!! Arriva!!!" em triplicata e o homem tem a sensação de que, sozinho, vale por um batalhão do Garibaldi, todo embandeirado.

Diante disso começo a achar óptimo o nosso "Estou Gozando! Estou Gozando!". É alegre, amoroso e ligeiramente sacana. Mesmo porque gozar tem vários outros sentidos no Brasil e cada qual mais agradável: rir, fazer graça, sentir prazer, desfrutar de uma coisa boa, viver satisfeito. Serve também para você se arriscar a levar uma boa gozada da mulher se não a fizer gozar.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Não Sei Quantas Almas Tenho



Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não atem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.

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A alma está oferecida a tudo, nada lhe é forte.
Assim passa o bem da vida, como passa o mal da morte.

domingo, 19 de outubro de 2008

Vandalismo


Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.

Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Vertem lustrais irradiações intensas
Cintilações de lâmpadas suspensas
E as ametistas e os florões e as pratas.

Como os velhos Templários medievais
Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos ...

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!
Augusto dos Anjos

sábado, 18 de outubro de 2008

Rosa de Espuma


O meu amor não tem
importância nenhuma.
Não tem o peso nem
de uma rosa de espuma!

Desfolha-se por quem?
Para quem se perfuma?

O meu amor não tem
importância nenhuma.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

SE TODOS FOSSEM IGUAIS A VOCE



Vai tua vida
Teu caminho é de paz e amor
A tua vida
É uma linda canção de amor
Abre teus braços e canta a última esperança
A esperança divina de amar em paz

Se todos fossem iguais a você
Que maravilha viver
Uma canção pelo ar
Uma mulher a cantar
Uma cidade a cantar
A sorrir, a cantar, a pedir
A beleza de amar
Como o sol, como a flor, como a luz
Amar sem mentir, nem sofrer

Existiria a verdade
Verdade que ninguém vê
Se todos fossem no mundo iguais a você

© Edições Euterpe LTDA
in "Orfeu da Conceição"1956
in "Tom, Vinicius, Toquinho e Miúcha - Gravado ao vivo no Canecâo"
in "Vinicius de Moraes"
in "Poeta, moça e violão / Vinicius Clara Toquinho"
in "Songbook ¿ Volume 1"
in "Vinicius"
in "Jobim Sinfônico

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Quem é você?


"Quem é você?", perguntou a Lagarta. Alice retrucou, bastante timidamente:
"No presente momento - eu não sei muito bem, Senhora - eu sei quem eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho mudado muitas vezes desde então."


Lewis Carroll - Alice no País das Maravilhas que teve sua primeira publicação em 1865.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Ismalia



Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Motivo


Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

A Cavalgada



A lua banha a solitária estrada...
Silêncio!... mas além, confuso e brando,
O som longínquo vem se aproximando
Do galopar de estranha cavalgada.

São fidalgos que voltam da caçada;
Vêm alegres, vêm rindo, vêm cantando,
E as trompas a soar vão agitando
O remanso da noite embalsamada...

E o bosque estala, move-se, estremece...
Da cavalgada o estrépito que aumenta
Perde-se após no centro da montanha...

E o silêncio outra vez soturno desce,
E límpida, sem mácula, alvacenta
A lua a estrada solitária banha...

domingo, 12 de outubro de 2008

O VELHO E A FLOR


Por céus e mares eu andei
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber o que é o amor
Ninguém sabia me dizer
E eu já queria até morrer
Quando um velhinho com uma flor assim falou

O amor é o carinho
É o espinho que não se vê em cada flor
É a vida quando
Chega sangrando
Aberta em pétalas de amor
in Poesia completa e prosa: "Cancioneiro"

Porque eu tenho esperança e muita fé
Porque eu quero ter amor bem mais ainda
Porque te amo, Senhora de Nazaré
Quero puxar a corda da berlinda

Ave, ave ó Senhora da Berlinda
Ave Maria este é meu grito de fé
Ave, ave, Deus te fez a flor mais linda
Ave, ave Maria, Senhora de Nazaré

A tua corda, me enlaça nesta hora
Me prende a Deus de corpo, alma e coração
Assim é doce ser escravo teu
Senhora servindo a Deus
Em cada homem meu irmão

Em Nazaré eras escrava do Senhor
Porém ninguém viveu maior libertação
Cordas de Deus te amarraram por amor
Foi a graça que prendeu teu coração

Puxar a corda da berlinda é para mim
O compromisso de levar-te e seguir
Pelos caminhos desta vida até o fim
É só fazer aquilo que Jesus pedir.


Padre Antonio Maria

Feliz Cirio a todos!!!

sábado, 11 de outubro de 2008

As Pombas


Vai-se a primeira pomba despertada…
Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada…

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada…

Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais…

Segredo


Meu coração é tão pequeno...
Se você mexer nele
ele não 'guenta.

Meu coração é tão pequeno...
Não sei dizer se me derruba
ou me sustenta.

Meu coração é tão pequeno...
Decerto veio ao avesso
ou mesmo inverso.

Meu coração é tão pequeno...
Na palma da mão cabe ele
e dentro dele, o Universo.

Pedro Tostes

Imagem: Mallmix

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

OPERARIOS EM CONSTRUCAO


Às vezes, enquanto trabalho em casa, na minha máquina, e busco no abstrato da paisagem urbana a forma do que quero dizer, acabo esquecendo de tudo para fixar minha atenção sobre os operários que terminam o edifício em frente. Chegaram agora à fase em que só falta pintar as esquadrias e dar caiação final no primeiro andar. Venho, há meses, observando-os trabalhar, erguer a sólida estrutura de oito pisos, com três apartamentos por andar. Vi-os situar as fundações, levantar o cipoal de aço e cimento que era como o esqueleto do prédio. Vi-os colocar-lhe os soalhos, enquadrar-lhe as portas e janelas, revesti-lo de sua epiderme intensa de tijolos refratários. Fui espectador emocionado de suas perigosas passagens para a prancha móvel, à guisa de elevador, sobre a área mínima da qual suspendiam-se para rebocar e caiar os grandes muros externos laterais da construção paciente e imóvel. Juro que ouvia tambores surdos, como antes do número de sensação ao trapézio volante de um circo, cada vez que um daqueles homens cor de cimento fazia arriscadíssima passagem da janela para a prancha estreita presa a roldanas colocadas no alto do edifício. Admirei-os em suas displicentes poses escultóricas, mãos na cintura sobre a tábua balouçante, indiferentes à sucção do abismo aberto em espirais de morte sob seus pés. A um vi fazer pipi lá para baixo, num perfeito à-vontade, provocando-me necessidade idêntica, ai de mim, fruto de uma reação de meu vago-simpático (pois que sofro de vertigem das alturas). À noite, ouvi-os cantar, no barracão que levantaram no pátio dos fundos, enquanto o fogo de sua cozinha rústica crepitava no escuro e seus violões ponteavam bordões dolentes. Apreciei-os brincar e brigar, passarem-se objetos, jogando-os com incrivel precisão, discutir problemas de construção e lances de futebol e receber empregadas da vizinhança com as quais se internavam prédio adentro: e que alegres voltavam desses rápidos seqüestros!
Agora a estrutura se erige ¿ mais um apartamento na colmeia em torno ¿ e os operários esticam seu labor na preguiça dos retoques finais. Ergueram o prédio. Cumpriram seu dever. Criaram com suas mãos o plano de um arquiteto. Deram vida ao espaço. E em verdade eu vos digo que é justo o lazer que ora se permitem, pois multiplicaram uma só unidade residencial em muitas, capazes de abrigar as alegrias, tristezas, amores e lutas de outros tantos homens. E, fazendo-o, fizeram trabalho de homem.

09.1953
in Para uma menina com uma flor (crônicas)
in Poesia completa e prosa: "Para uma menina com uma flor"

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

achados do achismo

antes
eu achava isso e aquilo e o caralho

iliações deduções conclusões
ate achei que me achara

`as vezes me achando o cara
`as vezes me achando um chato
achei q era o rei do insight

acabei enchendo o saco



ontem
diante do espelho
me achei no fundo do outro lado:

agora
eu não acho mais nada

Cairo Trindade

quarta-feira, 8 de outubro de 2008


sinto, meus filhos
se só lhes deixo
palavras ao vento
retalhos [gastos]
de versos inacabados
dívidas de duvidas
para que vocês (a)paguem

[cem conflitos]

dividam entre si
[e transmitam aos seus]
a riqueza de espírito


Valeria Tarelho

terça-feira, 7 de outubro de 2008

As Realidades da Alma



É certo que o homem fala a si mesmo; não há um único ser racional que o não tenha experimentado. Pode-se até dizer que o mistério do Verbo nunca é mais magnífico do que quando, no interior do homem, vai do pensamento à consciência, e volta da consciência ao pensamento. (...) Diz, fala, exclama cada um consigo mesmo, sem que seja quebrado o silêncio exterior. Há um grande tumulto; tudo fala em nós, excepto a boca. As realidades da alma, por não serem visíveis e palpáveis, nem por isso deixam de ser também realidades.

In 'Os Miseráveis'

IMAGEM: DELGADINA

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Poemas do Irremediavel (II)




Vivo como se andasse

me afogando,

e onde estiver, aí,

será mar alto,

e eu sempre mais só, desesperado,

a buscar entre ondas,

uma de apego,

exílio e salvamento:

durante os dias, espero as noites,

a fumaça de barcos, um sinal.

Mas há as noites — oh horror

das noites —

intermináveis no ar sem sono,

onde um farol,

(uma estrela houvesse)

apenas iluminariam

o medo de me perder

por me salvar:

como esperar um braço

quando o mar é grama

para o vento,

ou eco dos ecos?

Mesmo que um braço me fosse estendido

já não haveria

porto...

domingo, 5 de outubro de 2008


"Nós vos pedimos com insistência:
Nunca digam ' Isso é natural'
Diante dos acontecimentos de cada dia,
Numa época em que corre o sangue,
Em que o arbitrário tem força de lei,
Em que a humanidade se desumaniza.
Não digam nunca: ' Isso é natural ',
A fim de que nada passe por imutável."

sábado, 4 de outubro de 2008

Trecho de Livro... Vinho & Guerra


... Maurice morreu em 1962. Alguns anos mais tarde, examinando os papeis do pai, Robert descobriu uma carta que ele escrevera da prisão para a mulher em 1941.

Em minhas meditacoes, não encontro nada na vida que conte mais que a felicidade que podemos da aos outros, o bem que podemos fazer. E isto que devemos ensinar aos nossos filhos, a pensar mais nos outros que em si mesmos, pois e dessa maneira que vão encontrar a mais nobre de todas as satisfacoes.


A Segunda Guerra Mundial foi o momento decisivo nas vidas dos que iriam gerir os vinhedos franceses. Ela moldou não só quem eram, como quem iriam se tornar. ...

Do livro Vinho & Guerra : Os franceses, os nazistas e a batalha pelo maior tesouro da Franca, de Don e Petie Kladstrup da editora JZE

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Um urubu pousou na sorte do mundo



Afinal, o que está mudando no mundo atual? Esse apagão inexplicável em NY é o indício de que não há mais controle sobre as coisas. O que vem aí? Desde a chegada de Bush que a história entrou num ataque epiléptico. Da noite para o dia, depois de uma eleição fraudulenta, começou o vexame institucional dos USA. Um uburu pousou na sorte do mundo. Desde que esse homem fatal entrou, obedecendo cegamente aos desejos de Osama, desencadeou-se um novo tempo no Ocidente, com confrontos, estímulos ao terror, ataque à Europa, ao progresso humanista e cultural, à ecologia; tudo isso depois de arrebentar o belo superávit americano que Clinton deixara e de abrir o maior déficit público da vida americana. É espantosa a fragilidade do planeta nas mãos dessa anomalia política, com nosso destino determinado por um psicopata texano.
Bush é ativo e passivo, ele é cavalo e cavaleiro do apocalipsezinho de bosta que se montou para a estréia do século 21. Bush é a pista do que acontecerá daqui para frente. Clinton, o último babyboomer, foi a última persistência anacrônica dos anos 60.
Por isso, limpo minha velha bola de cristal e ataco de profeta maluco. De cara, meu pavor maior é que haja o surgimento de uma "cultura do medo" que se institucionalize nos USA. Tenho medo de que Bush consiga neutralizar para sempre a reação dos democratas americanos e estruture uma era bélica e boçal que será sempre realimentada por filhos e netos de Osamas e Saddams. Tínhamos a esperança de que a América fosse a vanguarda da democracia e de progresso técnico-cultural do novo século. Infelizmente, a América não será mais a "solução"; virou problema. Não haverá bonança tecnológica, nem mesmo uma pax americana.
Osama desmoralizou a Razão ocidental no 11 de setembro. Daqui para frente, seremos movidos por eventos aleatórios. Acaba o sonho de se alcançar uma harmonia política futura, um sonho de ordem qualquer. Platão quebrou a cara.
Acabam o happy end, a simetria, a lógica, o princípio, o meio e o fim.
Findou o sonho de "solução", michou a idéia de "futuro redentor". O futuro para o Bush é o passado.
Brinca no ar uma conjunção astral maligna, algo que talvez se tenha sentido nos anos 30, quando Hitler crescia. O inconsciente bárbaro está de novo entre nós. Há períodos históricos em que parecemos precisar da morte. Surge uma fome de irracionalismo, como que uma libertação animal dos freios da civilização.
A chegada de Deus foi a maior novidade do século 21. Só que Deus veio armado, Deus enlouqueceu com seu exército de fanáticos muçulmanos se matando e querendo nos destruir em nome de uma superstição. Quem diria que o novo século, tecnológico e científico, sucumbiria a essas sinistras macumbas? O suicídio veio cumprir a célebre frase de Albert Camus de que "o suicídio seria a maior questão filosófica do século 20". Não. O suicídio é a maior descoberta guerreira do momento e veio demonstrar que os humanos se matam por nada, que somos os mais estúpidos mamíferos da Terra. Acabou o chamado "outro" suave, francês, estruturalista, o "alter ego" da democracia e da tolerância e surgiu o "outro" sujo e mortífero, suicidando-se às gargalhadas.
A visão da morte na mídia é cada vez mais nítida. Depois dos corpos dilacerados pelas bombas, dos meninos sem braços, da valas comuns da África, estamos nos acostumando com a banalidade dos massacres. Não será mais possível esquecer a morte ou através da alienação da indústria cultural ou por sua transformação em espetáculo de efeitos especiais. A morte não mais estará num leito burguês com extrema-unção e família chorando, a morte será um cachorro pelas ruas, atacando de repente.
Diante desse caos, a política virou um parafuso espanado que gira no vazio da vida social. A política já é e será sempre um complemento secundário, apenas uma assessoria para as grande empresas. E sobra para a humanidade de imbecis apenas a política como um show, um balé enganoso. Schwarzenegger é um bom exemplo.
Outra novidade é que o capitalismo não tem mais rosto. E não vai se abrir; tende a se fechar num radical direitismo, partindo para a destruição dos Estados nacionais, como um robô obstinado. O inimigo principal não é mais a burguesia gorda e fumando charuto; o inimigo é um totalitarismo empresarial difuso que ninguém comanda. Agora, os homens progressistas, que se chamavam de "esquerda", não sonham mais com um "absoluto"; sonham com o relativo.
Diante da impotência política total, os grupos humanos tendem a se "balcanizar" em ilhas culturais e psicológicas; as tribos políticas surgirão cada vez mais. Já escrevi sobre isso e repito-o: vem aí, cada vez mais, um tribalismo que recusa o mundo mau sem denunciá-lo, mas aceitando-o como irremediável. Dentro de seu luto, as tribos se desenham. O que os slackers ou os góticos ou os rastas ou os ravers querem é alcançar uma identidade alternativa. Se antes a idéia de alienação era condenável, hoje a alienação é aquilo que se deseja alcançar. Melhor que "ilhas", que dão idéia de unidades celulares, o mundo se "desunifica" em esponja, em vazios, em avessos, em buracos brancos que vão se alargando à medida que o tecido da sociedade "contínua" se esgarça. Não são "células de resistência", mas "buracos de desistência".
A tragédia é que, fora das tabas protetivas das tribos, o resto da população mundial, indefesa e comum, vai precisar de consolos e esperanças, que serão, claro, produzidas pelo mercado das ilusões. Como os dramas vão virar tragédias e as comédias, chanchadas, as coisas vão ficar muito mais dolorosas e difíceis de entender e sofrer. Isso provocará a criação de falsas transcendências, de "profundidades" compensatórias, desde totalitarismos políticos até uma forte indústria de religiões dedicadas à "cretinização" das pessoas, para que suportem a vida.
Poxa, este artiguinho está cheio de esperanças, hein, querido leitor?

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O Pesa-Nervos



...O difícil é encontrar de fato o seu lugar e restabelecer a comunicação consigo mesmo. O todo está em certa floculação das coisas, no agrupamento de toda essa pedraria mental em torno de um ponto que falta justamente encontrar. E eu, eis o que penso do pensamento: A INSPIRAÇÃO CERTAMENTE EXISTE. E há um ponto fosforescente onde toda a realidade se reencontra, porém mudada, metamorfoseada - e pelo quê? - um ponto de mágica utilização das coisas. E eu creio nos aerólitos mentais, em cosmogonias individuais. ...
(extraído do livro Linguagem e Vida: Antonin Artaud - Ed. Perspectiva, 1995)

Quem nao conhece... foi poeta frances, ensaista, escritor, ator, director e esquizofrenico... ele mesmo se descreve...


Qui suis-je?
D'où je viens?
Je suis Antonin Artaud
et que je le dise
comme je sais le dire
immédiatement
vous verrez mon corps actuel
voler en éclats
et se ramasser
sous dix mille aspects
notoires
un corps neuf
où vous ne pourrez
plus jamais
m'oublier.

Enquadrado como do movimento surrealista, Artaud defende uma linguagem que pudesse exprimir objetivamente verdades secretas... porem a sociedade insiste em marginalizar verdades levando a vida em hipocrisia e estabelecendo na loucura ou no extermínio aqueles buscam exprimir suas verdades. Assim essa sociedade diagnosticou esquizofrenia a genialidade e a sensibilidade, morrendo internado em um hospital psiquiátrico em 4 de Março de 1948 em Ivry-sur-Seine. O problema é: Quem pode julgar, o que é sanidade e o que é loucura?

"A tragédia no palco não me basta mais, vou transportá-la para a minha vida".
Antonin Artaud

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Artigo ... objecto de uma discussão...


...“Aparentar ter competência é tão importante
quanto a própria competência.” (Chuck Lieppe)

Primeiro foi a Enron, gigante do setor energético e 7ª maior empresa dos EUA em faturamento, arrastando consigo a Arthur Andersen, uma das “Big Five” em consultoria e auditoria no mundo. Depois veio a WorldCom, 2ª maior operadora de telefonia a distância no país de Tio Sam, acionista com 25% de participação na verde-amarela Embratel. Agora somos surpreendidos, nós e mais 36.000 funcionários em 30 países, pela insolvência de uma multinacional reconhecida pela qualidade de seu leite, sucos, biscoitos, molhos e derivados. O elefante, não é mais, fã de Parmalat


O mundo de Narciso

Vivemos num mundo governado pela ditadura da imagem; o triunfo da estética sobre a moral. Não são apenas as empresas encasteladas em suntuosas sedes, dotadas de marcas, logos e slogans cativantes, com suas campanhas publicitárias milionárias, seus demonstrativos financeiros reluzentemente azuis, suas estratégias comerciais expansionistas e suas políticas de incentivo que convertem, por decreto, “recursos humanos” em “talentos humanos” – até que a cortina de fumaça seja desanuviada –, que logram a sociedade.

O mundo de Narciso afeta as pessoas como as corporações. Você é tão belo quanto seus trajes e seu último corte de cabelo possam sinalizar. Tão bom quanto a procedência dos diplomas e a fluência em inúmeros idiomas possam indicar. Tão valorizado quanto a competência demonstrada e os resultados apresentados possam parecer.

Em tempos passados, ocasião que meus olhos não se atrevem a enxergar, a “embalagem” era menos representativa. As empresas eram aquilo que produziam. As pessoas eram o que demonstravam. A palavra valia tanto que bastava limitar-se ao “fio do bigode”. Éramos mais essência. E mais essenciais.

Os tempos modernos trouxeram a velocidade da comunicação, o excesso de informação, a imprescindibilidade dos contratos. Estradas mais largas, carros mais rápidos pelo preço de imóveis, em trânsitos mais congestionados e caóticos. Condutores perfumados com fragrâncias que custam o equivalente a três salários mínimos, vestindo ternos de valor similar a um ano de serviço árduo de um trabalhador braçal.

Houve uma época na qual os preços eram formados para remunerar custos e proporcionar uma margem de lucro. Havia mais oferta do que demanda. A equação inverteu-se e o preço passou a ser ministrado por esta entidade denominada consumidor. Hoje, preços são dados por pedaços minúsculos de tecido chamados etiqueta, marcas grafadas nas hastes de óculos, grifes estampadas no visor e na pulseira de relógios.


O mundo de Quimera

Por extensão, nossos relacionamentos pessoais espelham este mundo midiático que nos cerca. Como nos ensina um provérbio russo, “não amamos as pessoas porque elas são bonitas, mas porque nos parecem bonitas porque as amamos”. O segredo da conquista é, singelamente, contemplar a fantasia.

O poeta francês André Breton dizia: “o que a gente esconde é mais ou menos o que os outros descobrem”. Bem adequado para quem escreveu o Manifesto Surrealista...

Balanços fraudados, currículos forjados, amores burlados. Vidas vividas na ilusão, imaginadas como devaneios à luz de uma quimera.

A Quimera era um monstro mitológico com cabeça de leão, corpo de cabra e cauda de dragão. Imagem nada agradável. Imagem que, mais cedo ou mais tarde, materializa-se, ao cair do véu da percepção que não carrega consigo conteúdo, sinceridade e paixão.


Artigo de Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA-FEA/USP, é empresário, consultor, escritor e palestrante, diretor da Infinity Consulting, diretor do Simb/Abrinq e membro executivo do NJE/Fiesp.